sexta-feira, 25 de março de 2011

Destino...

É difícil formular um juízo sobre a rebelião do menos filósofo dos anjos, sem mesclar nele simpatia, assombro e reprovação. A injustiça governa o universo. Tudo o que se constrói, tudo o que se desfaz, leva a impressão de uma fragilidade imunda, como se a matéria fosse o fruto de um escândalo no seio do nada. Cada ser se nutre da agonia de outro ser; os instantes se precipitam como vampiros sobre a anemia do tempo; o mundo é um receptáculo de soluços... Neste matadouro, cruzar os braços ou sacar a espada são gestos igualmente vãos. Nenhum soberbo desencadeamento saberia sacudir o espaço nem enobrecer as almas. Triunfos e fracassos se sucedem segundo uma lei ignorada que tem por nome destino, nome ao qual recorremos quando, filosoficamente desguarnecidos, nossa estância, aqui abaixo ou não importa onde, nos parece sem solução e como uma maldição que devemos sofrer irracional e imerecidamente. Destino: palavra seleta na terminologia dos vencidos... Ávidos de uma nomenclatura para o irremediável, buscamos um alívio na invenção verbal, nas claridades suspensas sobre os nossos desastres. As palavras são caritativas: sua frágil realidade nos engana e nos consola...

(Emil Cioran)

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