segunda-feira, 14 de março de 2011

Cotidiano.

As formas de se esconder são sempre suaves. Chove. Nem a madrugada mais consegue me consolar. Os acordes em progressão emulam uma profundidade que não é condizente com a circunstância. Há tempos não escrevo. Seria incorreto dizer que se trata de algum tipo de bloqueio criativo, afinal, o fluxo que liga o papel à grafite inexiste. Repetições me cansam. As variações se repetem. A borracha nunca apaga totalmente os traços, apenas dissimula a cicatriz que se mantém firme e forte, quero dizer, a planície foi alterada. Basta passar a mão com cuidado para sentir que ali tem muito mais do que um espaço vazio. A seiva ainda circula pelas veias invisíveis. Não eram cartas de amor. Nunca foram. Pequenos espasmos, perdidos em algum momento de distração, que por ironia ou desprezo – e aí pergunto, de quem?, para quê? -, se esqueceram de flutuar; fixaram-se como que escavando entre minas terrestres. Um passo em falso, uma martelada a mais e... Bem, e... E o teto despenca enquanto você procura a origem do zumbido, em vão. Aqui? Não. Ali? Não. Não. O ferrão vem, entra na sua pele, desnuda, queima. Simplesmente. Fogo? Gelo? O plano b: não, brisa não. É a borracha quem desliza.

(Outono, Julio Dupré)

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