Havia alguma beleza. Mas nada que me chamasse muita atenção – ainda mais quando se costuma trabalhar com certas tipologias. Como é que se diz mesmo? Você não faz meu tipo. Realmente não faz. Mas certamente eu reconhecia haver ali alguma beleza.
Quando comentei a seu respeito com uma amiga ela me disse:
- Ela é bonita. Mas não é o meu tipo de beleza.
Concordei na hora, apesar de haver alguma euforia. Lembro de todos os detalhes, da situação constrangedora e de nossas maravilhosas atuações. Atuo tão mal que com certeza seria um grande ator. Talvez por pertencer a um tipo excêntrico, porém universal.
Mas a euforia passou. Tudo passa não é mesmo?
A segunda vez foi ainda mais peculiar que a primeira. Peculiar não: estranha. Bem quando eu estava terminando de comer um salgado você apareceu. Engoli tudo de uma só vez, seco. E ai me concentrei: hora de pisar no palco. Quem não me conhece pensa que eu sou calmo. Ledo engano. Goffman iria se orgulhar bastante de mim, penso eu. Fato é que você se sentou ao meu lado de novo. Isso é fato, inegável, por mais que o jornalismo muitas vezes seja uma fraude. E quando isso aconteceu, isso de você se sentar ao meu lado, eu comecei a me revirar por dentro.
Gosto desse seu jeito de chegar de repente, sem nem pedir licença. Você chegou e sentou. Simplesmente isso. Olhou para mim e estendeu o polegar no mesmo instante que seu rosto fez uma expressão tão... Indefinível. Não sei descrever. Não consigo achar palavras. Nem se eu tivesse todas as folhas de papel do mundo para escrever eu conseguiria transmitir a mesma sensação. Mas em sua expressão eu podia notar certo exagero. Aliás, exagero é uma palavra que tem muito a ver com você.
Silêncio.
Eu não sabia o que dizer. Eu sou melhor ouvinte do que falante. Ainda mais quando fico nervoso. E eu estava nervoso. Calmamente nervoso. O silêncio me incomodava e isso não é um bom sinal. Mas não era aquele tipo de incômodo que acontece quando alguém que a gente não tolera se senta bem ao nosso lado. É silêncio distinto. É aquele que acontece quando a gente quer tanto falar alguma coisa mas não consegue. Incomoda porque a gente sabe que as ondas sonoras haviam de existir naquele momento. Foi quando seu celular tocou. E nessa altura lá tava eu com um livrinho na mão, com os olhos aqui e os ouvidos ai.
Fim do silêncio.
Eu falo tão baixo e tão pra dentro. E já você é toda falante. Pareço sempre menos interessado-nte do que realmente sou. E nesse dia você estava particularmente bonita. Cabelos curtos. Lembro que você até me perguntou se seu novo corte parecia com o da menina da frente. De fato era igual. Eu confirmei. Você sorriu amarelo. Não sei se por perceber que seu estilo não era único, não sei se por não ouvir de mim o que eu deveria ter dito. Embora eu acredite ser pelo motivo um, acho que a solução dois te faria se sentir melhor; ganharia seu dia, por assim dizer.
Meia-calça preta fio 40 tamanho M.
Tudo graças a uma meia-calça preta fio 40 tamanho M. Foi por isso que ganhei um tempinho a mais com você. Não havia pretensão, devo admitir. Até aquele momento não. De qualquer modo foi bom você me dizer que não gosta de cheiro de incenso porque eu simplesmente detesto esses aromas. E ai que tudo começou de verdade. No caminho de volta.
Na semana seguinte eu tomei a liberdade de tentar ajudar o meu destino. Consegui. Eu lhe trouxe o texto que havia prometido por alto. Não era um texto qualquer, de fato. Assim como eu percebi que meu primeiro olhar me traíra: você não era uma pessoa qualquer. Ainda mais com aquela sandália e as unhas dos pés pintadas de vermelho. Não que eu tenha uma particular fascinação por vermelho mas é que naquele dia vermelho era tudo que eu precisava.
Dessa vez não houve silêncio embora a sua intromissão fosse a mesma. Seu rosto é estranho. Suas expressões são estranhas. Mas quando você fica eufórica eu isso sinto na minha pele. E de repente eu me deparei com uma gargalhada que há muito eu não presenciava. Entrei em outro mundo. Ainda não foi dessa vez que entrei no seu mundo embora tenha dado um primeiro passo. Mesmas crises, mesmas reclamações. E reclamar sempre é tão gostoso. Gostoso como quando você, exagerada, perdia o controle das mãos e tocava em meus braços, de leve. Gostoso como quando os pelos da sua pele ficavam todos eriçados. Pena que é sempre mais difícil conseguir dizer o que se deve da maneira mais simples.
O que ficou na lembrança foram dois pés pequenos com unhas vermelhas pisando em solo lunar e um pequeno aviso:
Bem vinda à superfície.
Quando comentei a seu respeito com uma amiga ela me disse:
- Ela é bonita. Mas não é o meu tipo de beleza.
Concordei na hora, apesar de haver alguma euforia. Lembro de todos os detalhes, da situação constrangedora e de nossas maravilhosas atuações. Atuo tão mal que com certeza seria um grande ator. Talvez por pertencer a um tipo excêntrico, porém universal.
Mas a euforia passou. Tudo passa não é mesmo?
A segunda vez foi ainda mais peculiar que a primeira. Peculiar não: estranha. Bem quando eu estava terminando de comer um salgado você apareceu. Engoli tudo de uma só vez, seco. E ai me concentrei: hora de pisar no palco. Quem não me conhece pensa que eu sou calmo. Ledo engano. Goffman iria se orgulhar bastante de mim, penso eu. Fato é que você se sentou ao meu lado de novo. Isso é fato, inegável, por mais que o jornalismo muitas vezes seja uma fraude. E quando isso aconteceu, isso de você se sentar ao meu lado, eu comecei a me revirar por dentro.
Gosto desse seu jeito de chegar de repente, sem nem pedir licença. Você chegou e sentou. Simplesmente isso. Olhou para mim e estendeu o polegar no mesmo instante que seu rosto fez uma expressão tão... Indefinível. Não sei descrever. Não consigo achar palavras. Nem se eu tivesse todas as folhas de papel do mundo para escrever eu conseguiria transmitir a mesma sensação. Mas em sua expressão eu podia notar certo exagero. Aliás, exagero é uma palavra que tem muito a ver com você.
Silêncio.
Eu não sabia o que dizer. Eu sou melhor ouvinte do que falante. Ainda mais quando fico nervoso. E eu estava nervoso. Calmamente nervoso. O silêncio me incomodava e isso não é um bom sinal. Mas não era aquele tipo de incômodo que acontece quando alguém que a gente não tolera se senta bem ao nosso lado. É silêncio distinto. É aquele que acontece quando a gente quer tanto falar alguma coisa mas não consegue. Incomoda porque a gente sabe que as ondas sonoras haviam de existir naquele momento. Foi quando seu celular tocou. E nessa altura lá tava eu com um livrinho na mão, com os olhos aqui e os ouvidos ai.
Fim do silêncio.
Eu falo tão baixo e tão pra dentro. E já você é toda falante. Pareço sempre menos interessado-nte do que realmente sou. E nesse dia você estava particularmente bonita. Cabelos curtos. Lembro que você até me perguntou se seu novo corte parecia com o da menina da frente. De fato era igual. Eu confirmei. Você sorriu amarelo. Não sei se por perceber que seu estilo não era único, não sei se por não ouvir de mim o que eu deveria ter dito. Embora eu acredite ser pelo motivo um, acho que a solução dois te faria se sentir melhor; ganharia seu dia, por assim dizer.
Meia-calça preta fio 40 tamanho M.
Tudo graças a uma meia-calça preta fio 40 tamanho M. Foi por isso que ganhei um tempinho a mais com você. Não havia pretensão, devo admitir. Até aquele momento não. De qualquer modo foi bom você me dizer que não gosta de cheiro de incenso porque eu simplesmente detesto esses aromas. E ai que tudo começou de verdade. No caminho de volta.
Na semana seguinte eu tomei a liberdade de tentar ajudar o meu destino. Consegui. Eu lhe trouxe o texto que havia prometido por alto. Não era um texto qualquer, de fato. Assim como eu percebi que meu primeiro olhar me traíra: você não era uma pessoa qualquer. Ainda mais com aquela sandália e as unhas dos pés pintadas de vermelho. Não que eu tenha uma particular fascinação por vermelho mas é que naquele dia vermelho era tudo que eu precisava.
Dessa vez não houve silêncio embora a sua intromissão fosse a mesma. Seu rosto é estranho. Suas expressões são estranhas. Mas quando você fica eufórica eu isso sinto na minha pele. E de repente eu me deparei com uma gargalhada que há muito eu não presenciava. Entrei em outro mundo. Ainda não foi dessa vez que entrei no seu mundo embora tenha dado um primeiro passo. Mesmas crises, mesmas reclamações. E reclamar sempre é tão gostoso. Gostoso como quando você, exagerada, perdia o controle das mãos e tocava em meus braços, de leve. Gostoso como quando os pelos da sua pele ficavam todos eriçados. Pena que é sempre mais difícil conseguir dizer o que se deve da maneira mais simples.
O que ficou na lembrança foram dois pés pequenos com unhas vermelhas pisando em solo lunar e um pequeno aviso:
Bem vinda à superfície.
Um comentário:
que engraçadinha a história.
tô gostando delas!
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