Pergunta - O tédio nesse sentido faz parte dessa categoria da temporalidade que é outra, diferente?
Cioran - Sim, exatamente, porque o tédio está finalmente baseado no tempo, no horror do tempo, no medo do tempo, na revelação do tempo, na consciência do tempo. Os que não têm consciência do tempo não se entediam; a vida só é suportável se não houver consciência de cada momento que passa, se não for assim está tudo perdido. A experiência do tédio é a consciência do tempo exasperado.
Pergunta - O sr. acaba de dizer algo que mostra até que ponto todo escrito esconde uma voz subterrânea...
Cioran - Todos os nossos atos têm subterrâneos, e é isso que é psicologicamente interessante, nós só conhecemos a superfície, o lado superficial. Acedemos ao que é formulado, mas o importante é o que não é formulado, o que está implícito, o segredo de uma atitude ou de uma proposição. É por isso que todos os nossos juízos sobre os outros, mas também sobre nós são parcialmente falsos. O lado mesquinho fica camuflado. Ora, o lado mesquinho é profundo, eu diria mesmo que é o que há de mais profundo nos seres, e é aquele a que menos temos acesso.
Os grandes escritores são precisamente aqueles que têm o sentimento desses baixos, Dostoiévski principalmente. Ele revela tudo o que é profundo e aparentemente mesquinho, mas é mais que mesquinho, é trágico; são esses os verdadeiros psicólogos. Eu conheço muita gente que escreveu romances e fracassou —mesmo Mircea Eliade escreveu muitos romances e fracassou, por quê? Porque eles só traduzem os fenômenos de superfície e não a origem dos sentimentos. A origem de um sentimento é muito difícil de captar, mas é isso que é importante e isso é válido para qualquer fenômeno: para a fé religiosa etc. Como começou? Por que continuou? É esse o desafio e só quem tem a divinação é capaz de enxergar de onde vem isso. E isso não vem da razão.
Pergunta - Também nas suas leituras o sr. está atrás dessa origem?
Cioran - Estou, e na minha vida também. O que é formulado é só uma parte do pensamento. É por isso que há poucos romancistas verdadeiros. Todo mundo pode escrever um romance mas não se trata apenas de escrevê-lo. Dostoiévski, para mim, é o único que foi até as origens dos atos; vê-se muito bem porque suas personagens fizeram isto ou aquilo, mas não se vê de imediato. Minha atitude não tem nada a ver com a psicanálise, nada, pois ela quer curar; não é isso que é interessante. É o demônio que habita os seres que importa —mas como captá-lo?
Cioran - Sim, exatamente, porque o tédio está finalmente baseado no tempo, no horror do tempo, no medo do tempo, na revelação do tempo, na consciência do tempo. Os que não têm consciência do tempo não se entediam; a vida só é suportável se não houver consciência de cada momento que passa, se não for assim está tudo perdido. A experiência do tédio é a consciência do tempo exasperado.
Pergunta - O sr. acaba de dizer algo que mostra até que ponto todo escrito esconde uma voz subterrânea...
Cioran - Todos os nossos atos têm subterrâneos, e é isso que é psicologicamente interessante, nós só conhecemos a superfície, o lado superficial. Acedemos ao que é formulado, mas o importante é o que não é formulado, o que está implícito, o segredo de uma atitude ou de uma proposição. É por isso que todos os nossos juízos sobre os outros, mas também sobre nós são parcialmente falsos. O lado mesquinho fica camuflado. Ora, o lado mesquinho é profundo, eu diria mesmo que é o que há de mais profundo nos seres, e é aquele a que menos temos acesso.
Os grandes escritores são precisamente aqueles que têm o sentimento desses baixos, Dostoiévski principalmente. Ele revela tudo o que é profundo e aparentemente mesquinho, mas é mais que mesquinho, é trágico; são esses os verdadeiros psicólogos. Eu conheço muita gente que escreveu romances e fracassou —mesmo Mircea Eliade escreveu muitos romances e fracassou, por quê? Porque eles só traduzem os fenômenos de superfície e não a origem dos sentimentos. A origem de um sentimento é muito difícil de captar, mas é isso que é importante e isso é válido para qualquer fenômeno: para a fé religiosa etc. Como começou? Por que continuou? É esse o desafio e só quem tem a divinação é capaz de enxergar de onde vem isso. E isso não vem da razão.
Pergunta - Também nas suas leituras o sr. está atrás dessa origem?
Cioran - Estou, e na minha vida também. O que é formulado é só uma parte do pensamento. É por isso que há poucos romancistas verdadeiros. Todo mundo pode escrever um romance mas não se trata apenas de escrevê-lo. Dostoiévski, para mim, é o único que foi até as origens dos atos; vê-se muito bem porque suas personagens fizeram isto ou aquilo, mas não se vê de imediato. Minha atitude não tem nada a ver com a psicanálise, nada, pois ela quer curar; não é isso que é interessante. É o demônio que habita os seres que importa —mas como captá-lo?
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