sábado, 29 de novembro de 2008

(Des) Conhecer.

Quando de repente mesmo as palavras resolvem me dizer não. Entre as lacunas, um mundo inteiro desaba sobre os meus dias, sobre as minhas horas, minutos, segundos. Um mundo inteiro, completo, vazio. Tudo ainda está ali, intacto. O mesmo espanto, intacto. Nos recuos, nas recusas, havia um mistério. Eu perguntei, pedi até, mas mesmo assim nada aconteceu. Nada além de alguns pontos dispersos. Não eram as pedras do caminho: as pedras eram o caminho. Na verdade o caminho estava sob elas. Timidamente, ainda me recordo quando você colocou um pé para fora. Sentiu algo qualquer como o peso de um alívio, o mesmo alívio que eu senti mesmo sem te enxergar. Não tardou muito, resolveu colocar o outro pé repetindo o ritual, olhando cuidadosamente ao redor. O tronco ainda estava preso à sombra, assim como os braços e o rosto. Havia uma vontade de sair dali, os pés já coçavam, o chão de terra batida já não mais feria. O breu encontrava luz. Aos poucos, era a luz que dominava o breu: um braço, depois o outro e em seguida, quando não havia mais o que temer, os olhos já se arrependiam do enorme tempo de escuridão. Não foi fácil te dar as mãos, afinal, eu estava totalmente preso à minha sombra. A primeira lembrança que me vem a cabeça é de uma risada. Não uma risada qualquer. Tanta coisa simples, tantas coisas simples... Sabe, coisas realmente simples e por isso mesmo difíceis – ainda mais porque eu permanecia no breu. Eu falei sobre tudo, tudo sobre o breu que havia em mim. E você dizia para eu não ter medo, que para sair do breu era preciso antes tirar o breu de dentro da gente. Você de alguma maneira mexia comigo, talvez por conta das mãos que lançava insistentemente em minha direção. Eu pegava nas mãos e tinha contato com um pouco de luz. Era exatamente sobre esse tipo de salvação que eu dizia. Nenhuma salvação fundamental. Apenas mãos, conforto, carinho, esse tipo de coisa: atenção. E você sabe, quando as mãos se tocam, no desenlace algo fica preso e não se solta jamais. Eu olhava para os pontinhos luminosos que reconfiguravam as linhas das palmas das minhas mãos. Pareciam constelações. É impossível não se atrever a encontrar figuras quando se enxerga estrelas perdidas no céu. Essa é a parte engraçada, verdadeiramente poética: acreditar nos desenhos. Chegou um ponto que eu já não mais conseguia separar a constelação de mim mesmo, o que era e o que não era. A certeza da dúvida é a possibilidade da ação. Sem te avisar, no dia seguinte, como eu bem sabia dos seus horários, resolvi que era a hora de sair, de me mostrar, de dizer da constelação, de dizer de tudo que havia dentro, da incapacidade de dizer o que era do que não era. Saí. Saí num ímpeto, como quem escreve a verdade, como quem deseja e não sabe, como quem ama. Antes de abrir a boca, você se assustou. Negou. Não acreditou. Acusou. Tateou na sombra, fingiu haver alguém por lá, conversou consigo mesma. Culpou. Não ouviu. Correu. A resposta? Você saiu do breu, mas o breu não saiu de você: a luz provoca mais medo do que a escuridão.

2 comentários:

Anônimo disse...

'você se assustou. Negou. Não acreditou. Acusou. Tateou na sombra, fingiu haver alguém por lá, conversou consigo mesma. Culpou. Não ouviu. Correu. '

-- se vc já sabe todas as respostas, mesmo sem ter me ouvido direito, é pq não precisa mais perguntar.

nem pra mim. nem praquela que lá atrás vc matou ou deixou morrer.ou deixou que te matasse.


eu estou desorganizada por dentro e por fora. não consigo parar de sentir e de pensar e de sentir de novo. não consigo lembrar as cenas (as últimas cenas), não consigo SENTIR para SABER o que aconteceu. Tem palvras soltas no ar. 'Eu gosto de vc'... e a resposta mais singela do mundo talvez fosse só uma repetição, um eco, um sopro... mas não. Me respondeu uma voz q vc não ouviu, pq vc é vc e não eu, q me soou duríssima, quase metálica: 'e o quê isso significa?'...e a minha resposta então veio e até agora estou tentando me entender: --'Nada.'
Eu disse que não significava nada.


não posso mesmo mais voltar aqui
até terça-feira. não tenho as matérias que prometi fazer. não tenho nada. só um monte dessa escuridão que vc falou aí, vai ver sou escura. vai ver nunca entendi picas de doçura, cuidado ou de luz.preciso ficar quieta e me concentrar no trabalho. me preocupo com vc. quero que vc tente enxergar tudo isso melhor. se vc não tiver paz eu também não tenho.


bjs

Where I'm Anymore disse...

Estou te devendo duas respostas, Renata. Bem, então vamos lá!

Sentir, pensar. Isso me lembra isso aqui:

http://br.youtube.com/watch?v=QEFmuQfDS2A

É dificil relacionar as formas com que essas duas 'manifestações' se entreaçam, Renata. Onde termina o sentir e começa o pensar? E vice-versa. Penso mais do que sinto, isso é fato. Quis ser o Caeiro, mas estou mais para o Álvaro de Campos.

Sobre a coisa da luz e da escuridão, esse texto, de fato coloca isso no limite. Não existe uma luz e uma escuridão em estado puro. É fato. Trata apenas de uma alegoria. Não estou falando de você, Renata. Não acho que as pessoas sejam puras. Só que existem circunstâncias em que há mais luz, outras em que há mais escuridão. Nem sempre todo doce é absolutamente doce. Pode parecer bobagem isso, mas não é.

Por fim: não quero que você se desorganize por conta desse espaço. Não há o objetivo aqui de te derrubar. Ao contrário: quero te ver melhor, maior. Sempre. Não quero que vir aqui seja algo que te faça sofrer. Não.

Beijão.