De repente, em pleno churrasco casual, o telefone da minha tia toca. Uma, duas, três vezes. Risos e caretas do lado de cá da linha apenas evidenciavam o clima ‘entusiasmado’ do outro lado. “Ah, fulana, mas você sabe o quanto eu te amo, não é? Porque, poxa, eu te amo para caramba”. Frases como essa davam o tom do nível de carência que o álcool costuma gerar no fim das festas. Nada contra. É algo divertido, ainda mais para quem, careta como eu e que não tem a mínima vocação para a coisa, se mantém sóbrio. Mas de repente o inesperado acontece:
- Guilherme, a sua tia quer falar com você.
Evidentemente fico surpreso. Pera lá, como assim? Enfim... Ressabiado, pego o telefone celular. A ligação é péssima.
- Como foi a sua virada?
- Ahn?
- É, o ano novo?
- Ah, foi tudo bem. Normal.
Aparentemente uma daquelas conversas superficiais de costume, isto é, pura função fática. De repente, sem mais nem menos, o ar da graça:
- É que eu queria te dizer uma coisa. Assim, deixa eu ver como eu vou falar.
- Ué tia. Não precisa ficar escolhendo as palavras não. Seja direta, até porque enrolação só causa mais problemas.
- Tá bom. É porque você não precisa se sentir o patinho feio, sabe? (...).
E de repente a constatação: a minha vida privada era a bola da vez pelos encanamentos da FAMÍLIA. Porém desta vez a minha reação foi tanto quanto diferente. Se antes, provavelmente, eu ficaria completamente inibido e fugiria da raia, apenas tratei de dar uma cordinha. Talvez por culpa da ‘pós-hipocrisia’, mas decidi apenas ‘ligar o foda-se’. Minha mãe pediu o telefone uma, duas, três vezes, mas a curiosidade em saber o que vazava a meu respeito no interior das tubulações, acabou sendo maior. Terminado o momento, passei o celular para minha mãe.
Terminado em partes. Cinco minutos depois, toca o meu telefone. Era meu Tio. Papo vai, papo vem, ele resolve passar novamente para esta minha Tia. E ela volta com pilha total:
- Mas poxa, meu rapaz, você tá precisando de arrumar um buraco, não é mesmo? Você tem pinto, certo? Você tem tesão, não é? Então? O que mais falta?
Longe de ficar puto com essa espécie de invasão - principalmente com meu primo que certamente vazou informações que eu pensava serem confidenciais à sua mãe – eu simplesmente dei risada de tudo que estava acontecendo diante dos meus olhos, quero dizer, ouvidos. Não apenas porque muito provavelmente ela sequer se lembrará do que me disse, mas porque neste estado de ataraxia da ‘pós-hipocrisia’, tudo parece realmente irrelevante. Pouco importa as impressões – simplórias, ainda que bem intencionadas - dos outros sobre seus sentimentos. Saímos detrás da moita exatamente por meio da pequena rachadura presente na tubulação.
Um comentário:
'Nada mais nada menos do que uma prova cabal da completa fragilidade humana.'
vc sabe o q é violência?
acho que sabe. sorte com a tubulação no seu kintal.
ps: letrinhas nesta 'verificação
de palavras' - stpro
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