sexta-feira, 3 de julho de 2009

Shut up...

E quando, depois de muito tempo, ao finalmente conseguir matar todos os seus fantasmas de uma só vez você acredita que conseguirá a tão sonhada liberdade, a câmera aparece e a grande cilada se revela: nem sequer se pode contar mais com suas últimas ilusões. Porque matar um fantasma nada mais é do que aniquilar uma parte de si mesmo, uma espécie de semi-suicídio por assim dizer. Resta apenas o buraco, o vazio, a solidão em sua forma mais crua e devastadora - a que curiosamente damos o singelo nome de vida. Só se tem noção disso quando o tiro já saiu pela culatra e não há mais o que ser feito. Naquela fase onde você mal sabia que artefatos como facões, espadas, revólveres, soníferos, estricninas da vida ou técnicas como jiu-jitsu, psicanálise, ioga, religião e vudu eram totalmente inúteis, ao menos havia a esperança de que acertando o meio com certeza se atingiria o fim desejado. Mas logo se percebe que a máxima 'fantasmas são fantasmas' é a mais pura verdade. E assim sendo, oras, por definição, embora invisíveis, eles possuem muito mais carne do que aqueles a quem costumamos chamar de vivos. Ainda assim nos resta o gostinho do condicional: quando... E quando o quando já não é mais quando mas sim um tempo perfeito? A revelação: ‘os tempos perfeitos, na verdade, são imperfeitos’. E o mais engraçado disso é que o golpe de misericórdia veio de onde eu menos esperava: um trechinho despretensioso de um livro que caiu em minhas mãos por obra do acaso. Nada mais apropriado, decerto. A saída não pode jamais ser encontrada. Enquanto você a procura, simplesmente não existe. É ela quem precisa te encontrar - até mesmo para te mostrar que não se trata de algo que se possa chamar exatamente de saída, mesmo o sendo. E no meu caso isso foi bastante claro: aquelas palavras não me eram estranhas de modo algum. Ao contrário, eram-me muito familiares. Ou seja, não se tratava de uma questão de conclusão mas de enfoque: intencionalidade x fatalidade. Algo como João e Maria: era fatal que o faz de conta terminasse assim. Não apenas era como foi. E quando isso eu entendi, veio o estalo – um estalo oco e metafórico, evidentemente. Os fantasmas murcharam como quando se desata o nó de um balão de gás. Não só os fantasmas, mas também o fantasma. Nessas oras o verdadeiro pecado original surge à tona: o Tédio - com um T bem grande para não apenas você, mas todo mundo poder enxergar direitinho. “Nada acontece, nada acontece, nada acontece...”. Até hoje nunca li em nenhum livro alguma tentativa realmente honesta de captar um momento tão morto e ao mesmo tempo tão vivo como essa angustiante espera indefinida por coisa nenhuma, pelo que não se sabe, pelo pelo. Também pudera, afinal, o dia em que um escritor se atrever a retratar a ausência de movimento, a rotina, o desmanchar do tempo sobre os ossos, terá em mãos a obra-prima do fracasso da literatura universal ou, numa perspectiva um pouco mais positiva - afinal de contas, devemos sempre procurar encontrar os ângulos mais favoráveis da nossa experiência, não? -, a arma mais letal para uma epidemia de suicídios. E eis que sem nenhum alarde o jogo vira e... acontece. E quando finalmente acontece você então se dá conta que desejaria jamais tivesse acontecido.

Tarde demais, meu bem - meu mal.

9 comentários:

Anônimo disse...

O trecho do livro vc guarda no bolso, não é assim? (tum/tum/tum - a linha volta a cair, sempre volta a cair.provavelmente nunca houve linha nenhuma).OK.de verdade. Aliás aprendi contigo a fórmula rápida e básica: OK.

uma vida oca sempre vai ser cheia de fantasmas. de bailarinas. de palhaços. talvez seja assim a sua. talvez a minha. não tenho a pretensão de julgar. muito menos de dissolver no ar o que ainda sinto de algum jeito e só por isso faz algum sentido. mas a dor vai e vem, o que significa que posso dar conta dela. mas a vida acontece, o que significa que ainda há tristeza e, ainda bem, alegria. se não pode ser a de construir, que assusta quem respira a desconstrução, quem sabe será a de fluir. só fluir. sem precisar fechar juízos. sem precisar de frieza, desalento, grosseria. sem a menor necessidade de, ao sair de cena, dizer ao outro, ao mundo ou ao espelho quem é que tem razão.


abs!

Where I'm Anymore disse...

Você é engraçada Renata. Mesmo!

Trechos ótimos, Renata!

'Não tenho a pretensão de julgar' - E paradoxalmente mesmo assim julga.

'Sem a menor necessidade de, ao sair de cena, dizer ao outro, ao mundo ou ao espelho quem é que tem razão'. - E paradoxalmente com o discurso anti-razão quer impor sua própria razão, como se nunca sequer tivesse feito isso.

O problema é esse: você faz tudo o que condena, Renata! Não só você, mas todo mundo, o que é de fato algo completamente normal. Mas vocês não se tocam que fazem isso. Leem a situação como lhes convém, eximem responsabilidades.

Gozado porque esse texto aí não tem nem rancor nem pretensão a qualquer tipo de verdade que não seja exclusivamente para mim. Há um trecho dele que, inclusive, você interpretou de maneira equívoca - pra variar - mas dessa vez eu vou me dar ao desfrute de não explicar.

E 'constatar não é julgar', muito embora também seja comum mascarar as duas coisas, o que de fato não ocorre neste caso.

Um abraço e se cuida!

Guilherme.

Anônimo disse...

Na arquibancada ... Desaprendendo a atuar ...

( Uma sombra passou por aqui ...)

Anônimo disse...

não quero impor nada e se vc não percebeu tudo o que está no meu texto de algum modo vale pra mim, pra vc, pra maioria das pessoas que conheço...se buscamos sempre a vida é pq lutamos sempre contra um vazio que nos ronda a todos. só te pedi pra tentar ser gentil, pra viver sua vida e parar de provocar alguém e a vc mesmo numa situação que entende (e sente? acho que provavelmente sente) como sem saída. pq a provocação tem me feito mal e acho que a ti tb. mas se vc diz que não tem provocado, que é piração minha, vou tentar entender isso, acreditar nisso. pronto. e viver. e desejar que vc tb viva, q ache seu caminho, pq sempre gostei de ti e gostar é querer bem, não interessa quantos milhões de paradoxos a gente perceba. é tentar sacar o que faz a gente sentir raiva ou desprezo por alguém de quem a gente gosta, e ver se tem como mudar isso, sacar até onde o problema está muito mais em nós do que fora da gente, e não ver a coisa como algo inevitável, muito menos como o motor das paixões e coisa e tal.

fica bem, se cuida tb
abs

Where I'm Anymore disse...

Olá Renata. O ponto é bastante simples: eu escrevo neste blog porque preciso entender. Nada mais, nada menos do que isso. Não escrevo para ofender ou provocar ninguém. De maneira alguma. O ponto é bastante simples: muito embora não tenha dado nada certo, eu simplesmente não tenho raiva ou rancor de ninguém. E isso provavelmente ninguém entende, porque interpreta o que eu aqui escrevo como um esforço deliberado de chamar atenção, quando não se trata disso. Há um esforço deliberado sim de escrever para me superar, para prosseguir. E se isso incidentalmente deixa alguém descontente, aí infelizmente eu não tenho nada a fazer. Eu sei o que eu faço, sei a maneira como eu ajo, conheço as minhas posturas muito bem para saber se eu estou ofendendo ou não alguém. Não tenho esse compromisso porque eu não gosto de fazer mal a ninguém, porque além de não resolver absolutamente nada, me faz mal. Sim: me faz mal ver pessoas que eu gosto mal. O problema é sempre a questão da conveniência e nesse jogo é muito mais fácil se fazer de ofendido do que entender e assumir as consequencias dos seus atos numa boa. É aí que eu volto a ponte da sua primeira mensagem: eu não me preocupo em sair de cena e jogar nada na cara de ninguém para sair por cima. Em outra circunstância já falei isso para outra pessoa e digo que sair é perder e aí não importa que seja sair por baixo ou por cima - porque 'perder mais ou perder menos' é perder de qualquer jeito, não? Só que o que acontece é que em geral as pessoas fazem exatamente isso: não conseguem apenas sair simplesmente; precisam cavar um fosso para jogar o outro e preservar o eu. Quero dizer, precisam de 'razões' para justificar suas escolhas e em geral só conseguem isso elegendo culpados. E aí que está: geralmente eu entro no jogo e assumo a culpa, mesmo sabendo que não há culpa, inclusive para preservar a pessoa de que eu gosto. Só que eu aprendi uma coisa simples: não tenho porque fazer isso. Eu simplesmente quero de fato entender os motivos, mas isso não implica jamais em querer transferir culpas e responsabilidades. E no fim das contas a questão é muito simples e realmente irracional: ou se gosta ou não se gosta e ponto final. Só que as pessoas tem medo ou vergonha de dizer isso na cara e preferem saídas idiotas como eleger defeitos que simplesmente não são defeitos, mas apenas características que não se deseja - o que não significa que seja ruim para todo mundo. O problema é transformar uma característica em um problema. E em geral é o que acontece ora de maneira mais ora de maneira menos explicita. Porque esse é exatamente o x da questão: transformando a característica em problema se exime de uma sensação de culpa ou frustração - quando os parâmetros não são estes! Preserva-se o seu eu as custas da degeneração do outro eu e ainda por cima perpetua-se a ilusão de um poderia ter dado certo, que no fundo as vezes é o que se queria que acontecesse - só que com a vantagem de se eximir da responsabilidade da tentativa.

Where I'm Anymore disse...

Cada um faz escolhas, mas é preciso a todo instante justificar que as suas escolhas são as corretas, sob pena de incorrer em arrependimento. Afinal, o tempo não volta. As pessoas não estão preparadas, em geral, para viver no presente, porque escolher é algo realmente desgastante. Como eu disse, é fechar caminhos. E não é fácil jamais chegar a conclusão de que se escolheu errado. Só que o problema é mais grave do que isso: nunca se saberá que a escolha não feita era realmente a melhor, muito embora sempre se crie o mito de que o 'não vivido' era o melhor. O problema é que se responsabilizar pelo peso das próprias escolhas é algo tanto grave. Logo, viva a ma-fé! Porque assim mais uma vez as pessoas se livram deste fardo! Daí a brincadeira do Cioran em dizer que as pessoas jogam a culpa nas outras até mesmo por uma enxaqueca de tão forte e sólido que é o hábito de transferir responsabilidades. Em compensação, eu digo que não transfiro as responsabilidades e eu sou consciente das minhas opções, dos riscos dela. Não elejo culpados por nada - sobretudo quando não se trata desse parâmetro de análise, e muito frequentemente não se trata. Mas eu jogo limpo, não dou explicações excusas, não me engano nem engano a quem eu falo. É o preço da sinceridade ser mal interpretado. Essa é a diferença: eu não arranjo desculpas para lidar com o que eu sinto/penso. Se eu sinto/penso, eu falo, demonstro de alguma maneira e demonstro aquilo que eu sinto/penso. Não tapo buracos com outros buracos, não faço bolas de neve, não crio ofensas a partir de coisas irrelevantes. Simples assim. E repito: não quero nem seu mal, nem o mal de ninguém por quem eu tenho, tive afeto. E quem me conhece de verdade, concretamente, sabe muito bem disso, que eu não sou de ficar causando intriguinhas ou qualquer coisa do gênero. O problema é que você realmente não me conhece - de modo geral a internet não permite este tipo de percepção, porque o máximo que ela consegue é perpetuar a insegurança; você fica em estado de vigilia o tempo todo a espera da pedrada só pra dizer 'eu já sabia' - quando não ataca a pedra antes só para se protejer de algo que sequer aconteceu ou aconteceria. A internet não permite confiança. Uma pena.

Seja feliz, Renata, se encontre, ame seu filho, aproveite seu trabalho e suas oportunidades, procure suas razões, tape seus buracos, fuja de seus becos, sinta a dor e a partir disso saiba valorizar os momentos de felicidade. Não há perfeição na vida, não existe uma fase de harmonia total ou plenitude absoluta. Você sabe, não preciso sublinhar este tipo de coisa.

Um abraço,

Guilherme.

Anônimo disse...

acho que já te disse alguma vez que esse negócio de seja feliz acho meio bobo, mas agradeço os bons votos!

espero que vc consiga ter alegria, de vez em quando, que é o que me move! bons amigos, amores, sensibilidade pra dor e a beleza, e um jeito de lidar com a vida que não te amargure tanto, que te permita um caminhar talvez um pouco mais leve!

acabo de receber mais uma msg sem remetente, deletei sem ler. talvez esse seja um bom caminho daqui pra frente, pelo menos até eu me sentir mais tranquila, mais firme.


abs pra ti tb.

Where I'm Anymore disse...

Você pode achar até meio bobo porque de fato a felicidade não é algo que possa ser intencionalmente adquirida. Nunca se sabe quando ela realmente virá, não é algo que esteja a nosso controle. De modo que eu quis apenas desejar que você tenha bons momentos e o desejo é o máximo que eu posso lhe oferecer.

Quanto ao e-mail sem remetente, jamais poderia ser eu, até mesmo se quisesse, pois assim que deixei meu último recado fui ao barbeiro cortar meu cabelo e acabei de chegar em casa apenas agora.

Um abraço,

Guilherme.

Anônimo disse...

ok.
abs